quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Sempre conosco...


"-Não acho que seja desgraçado - disse a grande voz.
-Mas não foi falta de sorte ter encontrado tantos leões?
-Só há um leão - respondeu a voz.
-Não estou entendendo nada. Havia pelo menos dois naquela noite...
-Só há um leão, mas tem o pé ligeiro.
-Como sabe disso?
-Eu sou o leão.
Shasta escancarou a grande boca e não disse nada. A voz continuou:
-Fui eu o leão que o forçou a encontrar-se com Aravis. Fui eu o gato que o consolou na casa dos mortos. Fui eu o leão que espantou os chacais para que você dormisse. Fui eu que assustou os cavalos a fim de que chegassem a tempo de avisar o rei Luna. E fui eu o leão que empurrou para a praia a canoa em que você dormia, uma criança quase morta, para que um homem, acordado à meia-noite, o acolhesse.
-Então foi você que machucou Aravis?
-Fui eu.
-Mas porquê?!
-Filho! Estou contando a sua história, não a dela. A cada um só conto a história que lhe pertence.
-Quem é você?
-Eu mesmo - respondeu a voz, com uma entonação tão profunda que a terra estremeceu. E de novo: - Eu mesmo - com um murmúrio tão suave que mal se podia perceber, e parecia, no entanto, que esse murmúrio agitava toda a folhagem à volta.
Shasta já não temia que a voz pertencesse a alguma coisa que o devorasse; nem temia que fosse a voz de um fantasma. Uma coisa nova aconteceu, um tremor que lhe deu certa alegria."
(As Crônicas de Nárnia - O cavalo e seu menino - Página 262; C.S. Lewis)